
“É inaceitável” que doentes oncológicos do Algarve tenham de ir a Sevilha
No mercado de Olhão, Catarina Martins criticou o facto de, na região, se ter deixado nas mãos dos privados tratamentos como a radioterapia, o que implica a recente decisão de fazer deslocar doentes oncológicos do Algarve para Sevilha, devido à necessidade de radiocirurgia, um tratamento que é essencial. A coordenadora do Bloco lembrou que “em 2006 estava previsto um investimento em radioterapia no Algarve e na altura o governo de Durão Barroso decidiu não fazer o investimento e fazer um contrato com os privados para terem o monopólio da radioterapia no Algarve”. O resultado desta decisão é que “neste momento uma parte continuam nos privados e outra parte acabam em Sevilha”, o que “não é normal”.E não são só os doentes oncológicos que enfrentam problemas na região – “também as urgências estão sempre a fechar, os profissionais estão a faltar, tanto nos cuidados hospitalares como nos cuidados primários”, há “pessoas sem médico de família, tempos de espera para consultas acima do que está regulamentado; isto está a acontecer porque não há investimento”.“O Algarve é o exemplo da política liberal de saúde e é o exemplo da destruição do SNS com prejuízos para a população”, afirmou ao apresentar um pacote para resolver os problemas locais. Trata-se de um diagnóstico que mostra um “ciclo de degradação” do SNS local com “a pressão privada no Algarve combinada com a não criação de condições de trabalho e de contratação para o SNS”.Como os problemas se agudizam no verão “mas não desaparecem durante o resto do ano”,são precisas condições de fixação como “garantir despesas de deslocação e de habitação para que os profissionais cá possam ficar” e “um processo para a certificação do centro hospital para garantir que a formação dos médicos possa ser toda feita no Serviço Nacional de Saúde e no Algarve”. É necessário garantir médico e equipa de família a todos os utentes e garantir acesso a consultas e cirurgias a tempo e horas. Mais em geral, “é preciso no mínimo garantir que a saúde chega ao mesmo nível que os outros ministérios no acréscimo da massa salarial para ser possível depois ter estas medidas de incentivo que são necessárias” (melhoria das condições de carreira e de trabalho).
Um projeto para cuidar do SNS algarvio
A proposta bloquista parte da constatação de que “em toda a região do Algarve não existe resposta pública para radioterapia, radiocirurgia e PET TAC, o que faz com que o SNS fique dependente de empresas privadas e de concursos internacionais”. Pelo contrário, “há muito que o SNS, em particular, o CHUA deveria ter estas respostas integradas nos seus serviços. Mas a agenda privatizadora tem impedido esse investimento, prejudicando brutalmente toda a população do distrito”.
Nas palavras do diploma, “a violência de impor viagens de centenas de quilómetros a doentes oncológicos, para serem tratados fora de Portugal, é só um dos resultados grotescos da perda de capacidade na resposta pública e que se está a agravar”.
Diz-se que “vários hospitais manifestam sérias dificuldades para garantir as escalas para funcionamento de diversos serviços”, exemplificando-se com “o encerramento constante de maternidades, urgências obstétricas e urgências pediátricas, entre outros serviços, que têm funcionado de forma intermitente”. Há ainda listas e os tempos de espera “intoleravelmente altos em algumas especialidades”, uma falta de profissionais “gritante” que resulta, por exemplo, na falta de médicos de família.
Catarina Martins diz que OE2023 é "absolutamente inaceitável"
A coordenadora do Bloco de Esquerda (BE), Catarina Martins, considerou este sábado que o Orçamento do Estado para 2023 "é absolutamente inaceitável", porque não garante que os salários sejam atualizados, mesmo no valor abaixo da inflação. O Bloco insiste na preocupação a propósito do reconhecimento do ministro das Finanças de que o acordo de rendimento (certeza de que os salários subiriam acima de cinco por cento ao ano, actualização num valor pequeno abaixo da inflação) “afinal não vale” e as empresas “farão o que quiserem”, ao mesmo tempo que é uma certeza a enorme borla fiscal às grandes empresas “que vão poder nunca mais pagar os impostos que devem, incluindo os prejuízos que tiveram por má gestão, durante todos os anos que quiserem”.
"O que há, é certo, é a enorme borla fiscal que vai dar ao Novo Banco e a outras grandes empresas, que vão poder nunca mais pagar os impostos que devem, deduzindo os prejuízos que tiveram por má gestão, durante todos os anos que quiserem", apontou. Para a líder bloquista, "não é possível que os salários e as pensões continuem a perder poder de compra todos os dias", enquanto alguns setores continuam a ter lucros milionários "e o Governo não faz nada".
Catarina Martins afirmou que "é possível responder à inflação, atualizar salários, pensões e combater a especulação com um controlo de preços e impondo um imposto sobre os lucros excessivos em setores como a grande distribuição, a energia e a banca".
PROPOSTA DE ADITAMENTO
PROPOSTA DE LEI N.º 38/XV/1.ª
ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2023
Doentes oncológicos do Algarve passaram a ter de ir a Sevilha fazer tratamentos. Isto porque em toda a região do Algarve não existe resposta pública para radioterapia, radiocirurgia e PET TAC, o que faz com que o SNS fique dependente de empresas privadas e de concursos internacionais. Há muito que o SNS, em particular, o CHUA deveria ter estas respostas integradas nos seus serviços. Mas a agenda privatizadora tem impedido esse investimento, prejudicando brutalmente toda a população do distrito.
A violência de impor viagens de centenas de quilómetros a doentes oncológicos, para serem tratados fora de Portugal, é só um dos resultados grotescos da perda de capacidade na resposta pública e que se está a agravar. Neste momento, o Centro Hospitalar Universitário do Algarve não tem sequer a necessária certificação à formação e os estudantes de medicina do Algarve estão a ser enviados para fazer internato no privado ou na região de Lisboa e Vale do Tejo. Se já há falta de profissionais, com a incapacidade de assegurar formação nos hospitais públicos da região, faltarão ainda mais.
Vários hospitais manifestam sérias dificuldades para garantir as escalas para funcionamento de diversos serviços. Exemplo disso são o encerramento constante de maternidades, urgências obstétricas e urgências pediátricas, entre outros serviços, que têm funcionado de forma intermitente.
As listas e os tempos de espera são intoleravelmente altos em algumas especialidades. Por exemplo, no hospital de Faro, existem 628 pessoas há 231 dias à espera de consulta de cirurgia, 820 esperam há quase um ano (357 dias) para consulta de dermatologia; 172 pessoas aguardam há 303 dias por uma consulta de endocrinologia e 1104 pessoas esperam 387 dias por uma consulta de ginecologia. Para oftalmologia o tempo de espera é de 607 dias (quase dois anos!) e a lista é de quase 5000 utentes. Em todos estes casos (e muitos outros) o tempo de espera está muito para lá do que está estipulado legalmente. O mesmo acontece no acesso a cirurgias, onde se aguarda quase 3 anos (940 dias) por uma cirurgia vascular ou quase 1 ano por uma cirurgia em urologia ou estomatologia.
A falta de profissionais nos hospitais do Centro Hospitalar e Universitário do Algarve é gritante. Segundo o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP), na urgência de Faro, onde deveriam estar 100 enfermeiros para garantir a totalidade das escalas, estão apenas 75. As consequências são equipas subdimensionadas e intermináveis horas extraordinárias que esgotam os profissionais.
À falta de profissionais acresce a forma como tanto a ARS como o CHUA trataram (ou melhor, destrataram os profissionais, em particular os de enfermagem). Assinaram-se acordos para a contagem total de tempo de trabalho, para a progressão de carreira e para o igual tratamento entre CIT e CTFP, mas depois nada aconteceu. Episódios destes só fazem crescer a desmotivação e a insatisfação dos profissionais que não vêem minimamente reconhecidas a sua importância e as suas funções, mesmo depois de uma pandemia em que foram a linha da frente.
Mas estes são apenas parte dos problemas que estão a degradar o SNS na região do Algarve. No final de 2011, 17% dos utentes estavam sem médico de família; um aumento de 3,1 pontos percentuais em apenas 1 ano. Em setembro de 2022, existiam 88.140 utentes sem acesso a médico e a equipa de família, o que compara com os 84.107 registados em dezembro de 2021 e com os 81.888 de setembro de 2021, ou seja, a situação piorou 2,7% em relação ao final do ano passado e 5,2% em relação há um ano.
A pressão privada no Algarve combinada com a não criação de condições de trabalho e de contratação para o SNS tem degradado a prestação de cuidados de saúde. Esse é um ciclo de degradação que é urgente interromper e inverter. Não é por acaso que a região do Algarve é, em simultâneo, uma das que tem maior presença de privados e uma das que cronicamente regista mais dificuldades em assegurar prestação de cuidados de saúde à sua população. A situação agudiza-se no verão, é verdade, face à pressão turística, mas não desaparece durante o resto do ano. Pelo contrário, a população que reside em permanência no distrito de Faro bem sabe as dificuldades que tem para aceder ao SNS.
Para pôr fim à degradação da Saúde na região do Algarve é preciso aumentar as capacidades de formação na região (o que exige a conclusão do processo de certificação do Centro Hospitalar Universitário do Algarve), criar condições para contratar e fixar mais profissionais, melhorar as condições de carreira e de trabalho e investir no SNS, nomeadamente para garantir médico e equipa de família a todos os utentes e para garantir acesso a consultas e cirurgias a tempo e horas.
É isso que o Bloco de Esquerda pretende com as seguintes medidas, a propor para o OE2023.
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe o aditamento do artigo XXX.º-A à Proposta de Lei, com a seguinte redação:
“Artigo XXX.º-A
Programa para acesso à saúde na região do Algarve
1.No ano de 2023 é aumentado o número de vagas para formação especializada na região do Algarve, seja nos cuidados de saúde primários, para a formação de especialistas em medicina geral e familiar e de especialistas em saúde pública, seja para a formação de especialistas hospitalares, devendo o Governo criar as condições para que tal aconteça sem colocar em causa a qualidade formativa.
2. O Ministério da Saúde, em conjunto com o Centro Hospitalar e Universitário do Algarve, doravante designado CHUA, cria as condições necessárias para a certificação e acreditação da qualidade e segurança da prestação de cuidados de todos os serviços do CHUA, possibilitando assim a continuidade de estágios nesta instituição e a continuidade do funcionamento do Mestrado Integrado em Medicina da Universidade do Algarve.
3. De forma a captar mais profissionais para o Serviço Nacional de Saúde são reforçadas, no ano de 2023, as vagas carenciadas, com incentivos associados, para a região do Algarve, sendo abertas todas as vagas necessárias identificadas pelos serviços.
4. São ainda reforçados os incentivos associados às vagas carenciadas, criando-se, para a região do Algarve e outras igualmente carenciadas, um apoio específico para fazer face às despesas relacionadas com habitação.
5. É aberta a possibilidade de os profissionais de saúde aderirem voluntariamente a um regime de exclusividade nas instituições do SNS da região do Algarve, sendo-lhes garantido, em forma de incentivo ao regime de exclusividade, uma majoração de 40% da sua remuneração salarial base e majoração em 50% dos pontos a relevar para progressão de carreira, entre outras matérias que venham a ser objeto de negociação e acordo com as estruturas representativas dos trabalhadores.
6. Em 2023 é promovida a progressão de carreira dos profissionais de enfermagem e de todos os outros trabalhadores da ARS Algarve e do CHUA relevando, para o efeito, todos os pontos e anos de serviço destes profissionais e procedendo-se à abertura de concursos para progressão em número suficiente para garantir a progressão de todos os trabalhadores em condições de progredir.
7. Aos trabalhadores em contrato individual de trabalho e em contrato de trabalho em funções públicas é dado igual tratamento no que concerne à remuneração, à atribuição de pontos por ano trabalhado, à incorporação e progressão em carreira e a outros aspetos laborais, onde não pode existir discriminação entre trabalhadores.
8. Na harmonização dos vários aspetos entre os regimes de contrato individual de trabalho e contrato de trabalho em funções públicas prevista no número anterior é sempre relevado o que for mais favorável para o trabalhador.
9. É criado um programa para recuperação, durante o ano de 2023, de todas as consultas e cirurgias cujo tempo de espera excedem o legalmente estabelecido, de forma a garantir o acesso a tempo e horas os cuidados de saúde de que a população necessita.
10. O programa previsto no número anterior, cujas verbas acrescem às transferências previstas para o CHUC e para a ARS Algarve, contempla, entre outras medidas, a contratação de profissionais, a utilização de capacidade instalada no SNS aos fins de semana e incentivos à recuperação de atividade.
Assembleia da República, XX de XXXXXXXXX de 2022.
As Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda